Caro Visitante/leitor
O “Correio das Lembranças” foi criado fundamentalmente para aqui repor o que fui publicando no centenário jornal da minha cidade, o Correio do Ribatejo, ao longo dos anos, sendo uma maneira de hipotéticos interessados a eles terem acesso.
O primeiro escrito que publiquei e incluído em Temas Varzeenses teve por título A Capela de Santo António, “Ex-libris” de Vilgateira e foi publicado no número de 22 de Fevereiro de 1991 e ilustrado com um desenho a tinta-da-china que executei para o efeito.
O texto e o desenho foram, entretanto, aqui reproduzidos.
Com a publicação de A Freguesia da Várzea (do concelho de Santarém) – Achegas para uma monografia, 2005, o mesmo desenho foi incluído a pág. 139.
Até aqui tudo normal.
Em princípios de Dezembro, sou contactado por e-mail com o pedido de autorização formulado por Saint-Clair Mello (Brasil) de permitir a utilização do meu desenho num texto que iria publicar no seu espaço ASFALTO & MATO, o que naturalmente autorizei e agradeci.
Sem dúvida que foi uma honra para mim o meu desenho ter sido escolhido entre muitas centenas, para não dizer milhares.
O texto muito interessante e bem escrito reflecte uma época que todos nós conhecemos e tem a vantagem de ser baseado em factos verídicos, segundo o autor nos veio a confessar.
Tudo isto me levou a publicar neste espaço, depois do consentimento do autor, o interessante artigo acompanhado do desenho e das palavras que teve a amabilidade de me dirigir.
Os meus leitores conterrâneos e não só ficarão a saber por onde anda o desenho da nossa capelinha de Sto. António.
Caro leitor: Não deixe de visitar o ASFALTO & MATO, onde além de prosa interessante encontra excelente poesia do nosso já Amigo, Saint Clair Mello a quem muito agradecemos.
JV
Postado em 10 de Dezembro de 2010, por Saint-Cair Mello
Nos primórdios da vila de Santo Antônio da Liberdade, hoje conhecida por Carabuçu, houve um padre que lá foi estabelecer seus rebanhos de fiéis, de gado e de mulheres.
Naquela época, as disputas de terra eram sangrentas. Terra nova, inexplorada, aberta à grilagem do mais esperto, do mais poderoso.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDbuSDUYdcNO8IplXHyOPjIrChxh9r6K1Lw_BdTn7wC2WT1IBnYF332ZIHgQLzkUKSngxYiIGwkozO_7hIPOsqgNZZG_qsPpb6mnF12uUn0q-tMIrpDQAU2V18o7YfUr0Dc-AMXvozhFJf/s320/V%25C3%25A1rzea.+Capela+de+Vilgateira.+S.C.+de+Mello.jpg)
Prestígio de padre pode ser discutido no céu, por anjos e santos, não em lugarejos perdidos do interior. Assim, montado em seu prestígio, o padre abocanhou alguns alqueires de terra, onde plantou café, criou gado, fixou colonos, construiu uma bela sede de fazenda. Ministrava os sacramentos e administrava seus domínios com competência canônica.
Mas padre é gente, é homem, por isso capaz de pecar tão desavergonhadamente como qualquer mortal. Ocorre, porém, que o padre decidiu pecar justamente com Lucinda, sertaneja prendada, bem apessoada, olhar de Capitu. Sua fiel, é verdade, embora mais fiel do coronel Napoleão, que a trazia alinhada como cavalo de charrete.
Foi o que bastou para que o coronel se destemperasse, perdesse a fé e o respeito pelas coisas sagradas e mandasse recado destabocado para o padre.
- Nicandro, diz lá pro padre Ambrósio que vou lhe dar uma sova, pra ele aprender a se meter com menina alheia.
O mulato foi e voltou com a resposta do padre:
- Diz lá pro seu coronel que em padre só se pode bater acima da cabeça, caso contrário é sacrilégio, punido com excomunhão.
Coronel Napoleão não gostou da resposta atravessada do homem de Deus e tomou as providências cabíveis: mandou pendurar o padre de cabeça para baixo no galho de uma figueira e desceu-lhe a gurumbumba, até sua reverendíssima resolver abrir mão de fazenda, de Lucinda e de paróquia.
De seu, a única coisa que o padre deixou por aqueles arredores foi uma meia dúzia de meninos, que, nas noites de sexta-feira de lua cheia, andavam virando lobisomem e mula sem cabeça.
Agradecimentos a José Varzeano pela cessão de seu belo desenho a ilustrar este texto.)