(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 28 DE MARÇO DE 1991)
É vulgar a imprensa trazer so domínio público determinados problemas originados pelo abate ou tentativa de abate de certas árvores que conseguiram, por determinadas razões, na maior parte dos casos pelo tamanho e longevidade, entrar na vida das populações, acabando pelo património real extravasar e vir a constituir um património comunitário.
Situações houve que deram origem até a levantamentos populares em zonas de acérrimo bairrismo.
Todos nós conhecemos por esse País fora, exemplares que constituem verdadeiros monumentos e como tal visitados. Vêm-me à memória e de repente, um secular castanheiro de tronco descomunal junto ao Santuário dos Remédios (Lamego), oliveiras multisseculares em Serpa e um cedro no Buçaco com mais de trezentos anos.
Há uns anos e se a memória não nos atraiçoa, lemos algures a edição de um livre que reunia precisamente estes monumentos do reino vegetal.
Não esquecer que grande número de topónimos, desde cidades a aldeias, teve por base o nome de árvores. Figueira e oliveira, pinheiro, carvalho e freixo, palmeira e castanheiro são alguns exemplos entre tantos.
Presentemente e que seja do nosso conhecimento, a freguesia da Várzea, nos seus cerca de 25 km2 não possui nenhum exemplar que mereça menção a nível nacional, como já teve, contudo, alguns têm bastante significado localmente e mesmo mais além.
A referência é feita por motivos diversos como a raridade, porte, passando pelo defeito e até a longevidade.
Umas, já não existem, ficaram contudo na memória deste povo ou mesmo referenciadas em livro, outras, mantêm-se de pé, cheias de saúde, continuando a desenvolver-se, outras, definhando-se de dia para dia.
Os “antigos”, diz o povo, referiam-se em quadras apropriadas ao pinheiro da Mafarra e à azinheira da Granja.
A – PINHEIRO DA MAFARRA
“Colossal de tronco e de ramagem e que serve aos que transitam por estes sítios de ponto de referência para a contagem do caminho”, é como Fialho de Almeida o apresenta.
No Guia de Portugal, de Raul Proença, 1927, pág. 370, é referido do seguinte modo: - “Há aí um famoso pinheiro, que se julga ter mais de duzentos anos, com trinta metros de altura e 7,5 de circunferência”.
Está desenhado no “In Memoriam”, organizado pelo Dr. Francisco Tavares Proença quer foi grande amigo do Doutor Oliveira Feijão.
Acabou por ser fulminado por um raio.
B – EUCALIPTOS DO RIO PAU
Eram treze que o “ciclone” arrancou num ápice. O estrondo provocado pela queda causou alarme nas redondezas, aterrorizando os vilgateirenses.
Bebiam fartamente no pequeno ribeiro.
O maior, dizem que três homens não conseguiam abraça-lo. De altura e copa correspondente ao tronco, nele, um casal de cegonha fazia todos os anos ninho, sob o qual, a passarada se acoitava ao cair da tarde, provocando grande chilreada que se misturava com o gorjear do regato.
C – AILANTO
Esta árvore, própria para a arborização de avenidas, situava-se no Outeiro da Várzea, mesmo à beira da estrada.
Tinha a particularidade do tronco ser bastante mais grosso junto à copa do que ao pé, parecendo-se com uma garrafa em posição invertida.
Diz o povo, na sua farta imaginação, que a árvore era assim devido ao facto de naquele local se realizar outrora a “praça de pessoal”, isto é, o contrato dos trabalhadores rurais feito com os patrões, que era selado por uma “molhadura” de meio litro de vinho na taberna defronte. O pessoal deslocava ao local muitas vezes em animais que eram amarrados ao pé da árvore que assim se via sacrificada pelo roçar das cordas e correntes!
O ailanto tomou uma configuração caprichosa e invulgar devido a qualquer deficiência que ocorreu no seu crescimento. Tornou-se muito conhecido e referenciado, precisamente por causa disso.
Quase seco, foi abatido em 1985.
D- PINHEIRO DA NARCISA
Árvore de grande porte que pertencia a esta quinta. Situava-se perto de um pombal junto à estrada que nos leva aos Casais da Aroeira, já na freguesia de Abitureiras.
Foi abatido em 1965 e vendido para a construção naval.
Lembramo-nos de o ver passar carregando grande camião.
E- OLIVEIRAS GROSSAS
Sendo a oliveira, no aspecto arbóreo, a rainha desta região, é natural que tivesse sido aproveitada para a impregnação de lendas e superstições.
Todos os vilgateirenses conheciam as “oliveiras grossas”, que de grossas já não têm nada, a não ser o nome, se ainda o têm. Contudo, ainda as conheci bem avantajadas.
Constituídas por três ou quatro pés bastante juntos, situavam-se à saída de Vilgateira, a caminho da Carneiria, mesmo junto à estrada.
Eram apontadas como albergue de fantasmas e almas do outro mundo, e a verdade é que muita gente, a horas mortas, não ousava passar por ali e quando o fazia, era com receio, procurando sempre que possível, companhia.
Os mais idosos ainda terão para contar factos “verídicos”.
F – CARRASQUEIRO DA FONTE
A caminho da Fonte de Vilgateira, junto à estrada, ao lado direito, entre velha e típica moradia e moderna vivenda, situa-se um exemplar deste arbusto silvestre que mais parece uma árvore, tal o tronco e copa que apresenta.
Em 1955 dizia-nos o então seu proprietário, pessoa bastante idosa, que sempre o tinha conhecido assim.
Estava convencido que se tratava de um arbusto secular.
G – AMOREIRA DE VILGATEIRA
Quem passar por Vilgateira, chama a atenção esta árvore de tronco longilíneo (1,70 m de perímetro) e aprumado, património da Junta de Freguesia.
O recanto não estava aproveitado, foi-o cerca de 1914, na comemoração de um “Dia da Árvore”. A pequena festa escolar englobou, além da plantação deste exemplar, a recitação de poesias alusivas so dia e a que assistiu o ilustre cirurgião, Doutor Oliveira Feijão.
Apesar de contar já com algumas dezenas de anos, mostra-se vigorosa, continuando a desenvolver-se. Veremos se os homens não a assassinam.
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Aqui fica o que nos foi possível compilar. É natural que existam na freguesia outras dignas de “historiar”, mas se existem, não as conhecemos.
Ultimamente voltou-se a falar muito no dia da árvore, comemorando-se mesmo em alguns locais.
Pensamos que é preciso incrementar muito mais a ideia e dar a lição prática às crianças já que o ensinamento torna-se muito mais profundo.
As Juntas de Freguesia com o apoio das Câmaras Municipais e a colaboração dos professores, poderão ter uma acção muito importante pois há sempre um local para plantar uma árvore.