(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 13 DE OUTUBRO DE 1995)
Nunca me es-queci do nome de Laurentino Veríssimo que ouvia pronunciar na minha infância e depois na adolescência, aos meus familiares mais próximos, ficandome na ideia de tratar-se de uma boa pessoa, defensora dos interesses da sua terra.
O então existente “Bairro Laurentino”, como o povo lhe chamava, era alvo das minhas surtidas, a malta do Matadouro possuía a sua identidade e não gostava de ver os seus domínios devassados pelos que eram corridos à pedrada quando calhava.
Comecei a sentir que o nome do bairro tinha relação com aquele que ouvia aos meus familiares que, questionados responderam afirmativamente.
A maturidade chegou, o interesse aguçou e com o rodar dos tempos, aqui e ali fui obtendo dados que iam aclarando a minha curiosidade até que, em 1986, na passagem do cinquentenário da sua morte, houve alguém que dele se lembrou publicando um interessante artigo intitulado – LAURENTINO VERÍSSIMO, INVESTIGADOR, MÚSICO E NENEMÉRITO, MORREU HÁ CINQUENTA ANOS, forneceu-me elementos que me possibilitaram conhecer melhor esta figura escalabitana de que tanto tinha ouvido falar em rapaz.
Laurentino Veríssimo nasceu em Santarém em 1855.
Republicano fervoroso, aplica os seus recursos económicos no desbravamento de São Lázaro onde faz construir um bairro para ser habitado por famílias de poucas possibilidades monetárias, abrindo uma larga avenida de acesso, isto em 1894 e que vieram a ter o seu nome.
Nomeado em 1915 bibliotecário municipal e Director do Museu Arqueológico, dedica-se com todo o entusiasmo às suas novas actividades.
A biblioteca “Camões”, quando ele toma posse, tinha pouco mais de dois mil volumes e duas décadas depois, ultrapassava os dezoito milhares devido ao seu constante e insano labor.
Muitos eruditos da época procuravam-no no sentido de obterem informações que enriqueciam os seus conhecimentos.
Como conservador do Museu, imprimiu-lhe um sentido de divulgação e procurou acautelar os objectos arqueológicos encontrados, apetrechando-o de novas peças.
Apressado, procura salvar o que restava do Convento de São Domingos e consegue a oferta de um histórico portal que entra no Museu em 1923.
Na altura da sua posse, o Museu possuiu cerca de duzentos objectos, adquiridos desde a fundação, em 1876 e devido à sua dedicação deram entrada mais de seiscentos, conforme refere o seu substituto, Eng. Zeferino Sarmento.
Deve-se a Laurentino Veríssimo um catálogo que elaborou das peças existentes no Museu, tomando em consideração os inventários anteriores.
A Edilidade da época tinha projectado ou deliberado demolir a velha e significativa Torre das Cabaças, relógio da cidade.
A voz e a pena de Laurentino Veríssimo levantou-se com tanta veemência, que só se calou quando conseguiu evitar o crime. A sua audácia veio-lhe a custara “pena de suspensão por trinta dias” com perdas dos respectivos vencimentos e melhorias”, mas isso para Laurentino Veríssimo pouco importava – o valor patrimonial que tinha salvo para a sua terra possuía um valor que não se comparava com qualquer outro.
A velha torre do relógio veio a ser considerada monumento nacional pelo decreto nº 14 985, de 3 de Fevereiro de 1928.
A quando da sua morte, ocorrida em 7 de Dezembro de 1936, a Câmara sanou em parte o erro cometido, já que ficou consignado em acta um voto de profundo pesar pelo seu falecimento, ele que foi um grande amigo de Santarém, da sus Biblioteca e Museu e até de grande parte da sua população. Todas as despesas do funeral ficaram a cargo da Câmara Municipal, segundo a mesma acta.
Laurentino Veríssimo foi um fecundo colaborador da imprensa regional, publicando, segundo levantamento de Bertino Coelho Martins, cento e vinte e nove trabalhos sobre a história local e nacional, nos periódicos: - “Correio da Extremadura”, “Combate”, (Santarém), “Vale do Tejo” (Almeirim) e “Terra Branca” (revista – Chamusca).
Além de um excelente músico, ajudou a fundar a Associação Comercial de Santarém.
Fica-nos a ideia que este santareno pôs sempre a parte espiritual à frente da monetária.
Das novas gerações poucas saberão da existência deste homem que deu o melhor de si à sua terra.
Sem dúvida que os trabalhos que publicou se fossem reunidos em livro, seria, como afirma Bertino Martins, para além de um acto de justiça e de reconhecimento pelo labor dum verdadeiro apaixonado pelas coisas de Santarém, de muito interesse para a historiografia local.
Não conheço nenhum dos cento e vinte e nove artigos publicados e não vai ser fácil conhecê-lo, tanto pela distância a que me encontro de Santarém, como pela dificuldade em encontrar os exemplares dos jornais em que se encontram. Ainda recentemente dirigimo-nos a um arquivo distrital afastado cerca de quatrocentos quilómetros da nossa residência e de trinta jornais que constavam da nossa lista, só três ou quatro encontrámos!
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“Laurentino Veríssimo – Investigador, Músico e Benemérito, morreu há cinquenta anos”, Bertino Coelho Martins, in Correio do Ribatejo de ?. 1986.
“As linhas de força da história Social de Santarém no século XIX”, Jorge Custódio, in Santarém a Cidade e os Homens, 1977
Arqueológio Scalabitano, Francisco Nogueira de Brito