sábado, 19 de dezembro de 2009

A farinação

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 27 SETEMBRO DE 1991)


Desde tempos recuados que pelo menos vem da Idade Média, que há referências a moinhos de vento.

Depois de moer o pão com o batimento de duas pedras, passou-se para os moinhos de braços, movidos por escravos e mais tarde por animais.

Em Portugal estes últimos tomaram a designação de atafonas, daí a existência deste topónimo, como acontece em Santarém.

Para aproveitamento da força do vento, existiram moinhos de vários tipos mas os mais difundidos em Portugal são constituído por um corpo em forma de tronco de cone, relativamente baixos, de alvenaria, caiados de branco e onde se rasgam a porta e uma ou mais janelas. É coberto por um tejadilho cónico e giratório que assenta no topo da parede. É dele que sai o mastro onde se fixam os varais, cruzados e onde se situam as quatro velas triangulares de pano e lona.

O tejadilho move-se conforme o vento impõe e por sistema não uniforme,

Os moinhos têm dois pisos ligados por escada interior. A moenda instala-se no superior e no inferior ficam a caixa onde cai a farinha que é para ali levada por uma conduta de madeira, e os anexos.

A estes moinhos chamam de tipo mediterrânico.

Encontram-se espalhados por todo o País, mas da grande maioria só restam as paredes, quando não parte.

É o que acontece na freguesia da Várzea que também teve os seus moinhos, não fosse ela uma região cerealífera, laborando numa altura já distante pois os idosos de agora nem aos avós ouviram falar do seu trabalhar.

[Moinho de Vilgateira.Des.de JV.]

Um, bem junto a Vilgateira, é conhecido naturalmente pelo moinho de Vilgateira (cota 79) e o outro, pelo moinho da Quinta da Amendoeira (cota 45), pela mesma razão.

Sobre o primeiro sabemos da existência de uma lenda que não chegámos a recolher, o que hoje muito lamentamos.

Quem a conhecia, já faleceu. Haverá na freguesia ainda alguém que a saiba contar?

Dentro do segundo nasceu e desenvolveu-se uma árvore, cuja copa ocupa o lugar da cúpula.

<[Moinho da Quinta da Amendoeira. Foto JV, 2009]

Em 8 de Janeiro de 1972 a Junta de Freguesia respondendo a um ofício da Câmara Municipal, informa existirem dois moinhos de vento dos quais só restam as paredes sendo de parecer que deveriam ser classificados como imóveis de interesse público. <[

O moinho de Vilgateira cuja área coberta é de 25 m2, tem um logradouro com 75 m2.


Se dos moinhos de vento ninguém se lembrar de trabalharem, não acontece o mesmo em relação aos hidráulicos – azenhas e moinhos propriamente ditos.

Os ribeiros que correm na freguesia proporcionaram a criação de um número apreciável de azenhas, chegando mesmo algumas a trabalhar ainda nos nossos dias.

A azenha é um moinho hidráulico de roda motriz vertical que dava grande rendimento, principalmente quando se verificou poder ser accionado por um fio de água conduzido pelo alto, por meio de uma caleira de madeira.

O moinho propriamente dito tinha roda horizontal e era o mais numeroso no País, onde se calculava existirem cerca de cinco mil!

No Ribeiro de Perofilho ficava, na Idade Média, um moinho “alveiro e segundeiro”, propriedade conjunta da Alcáçova e do Convento de Santa Clara. (1)

Uma azenha na Ribeira de Vilgateira, das últimas que deixou de trabalhar, acabou por dar origem ao topónimo Casais da Azenha. Já em 1838 o local era assim designado.

Na década de cinquenta deixou de funcionar uma azenha no ribeiro das Laranjeiras e na de 20, a da Quinta da Granja, no ribeiro das Fontainhas.

A dos Limões, no ribeiro de Perofilho, é referida com frequência e teria sido das últimas a deixar de trabalhar.

Pinho Leal, no seu sempre referenciado Portugal Antigo e Moderno, a pág. 766 do volume X, diz que o ribeiro de Perofilho move alguns moinhos.

Com o aparecimento de moagens de nova tecnologia, o que também aconteceu na freguesia, as azenhas foram ultrapassadas e consequentemente deu-se o seu natural abandono.

NOTA
(1) – Santarém Medieval, Maria Ângela V. Beirante, 1980, pág. 166.