quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A tuberculose, a sida da minha infância

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 2 DE ABRIL DE 1993)




Nesta vivência do MEU BAIRRO não se abordam só assuntos que nos causam saudades e que gostamos de recordar. Também existe naturalmente o outro lado. Nele, haverá assuntos que marcaram a nossa existência e que não podemos esquecer.

Já referimos a Guerra 39/45 que sentimos, ainda que não profundamente, de uma maneira que deixou marcas.

Hoje iremos lembrar com alguma amargura, outro assunto. Ainda que tivéssemos tido a felicidade de nenhum familiar próximo ter sido vítima dessa terrífica doença, apesar da nossa pouca idade, sentimos bem o ambiente que se respirava, deixando assim e também as suas marcas.

Doença infecto-contagiosa, produzida por um bacilo (bacilo de Koch) ataca sobretudo os pulmões.

Lembro-me muito bem de moradores no MEU BAIRRO serem vítimas desta então mortífera doença, para além disso, extremamente contagiosa.

Havia necessidade de evitar um certo número de contactos pelo que, apesar da nossa tenra idade, éramos constantemente alertados para isso.

Quando se dizia que fulano estava tuberculoso, o seu destino facilmente se adivinhava. Os padecentes emagreciam, apresentavam-se pálidos (macilentos) uma ponta de febre, tosse seca (tosse de cão), débeis, aparecendo por fim as hemoptises.

Quando se chegava a este ponto, era o terror, a possibilidade de contágio e alguns dos meus amigos tinham familiares doentes.

Quando havia posses, os doentes iam para o campo respirar ares puros, repouso absoluto e uma super alimentação, avultando a carne grelhada, muito mal passada, de maneira que o sangue escorresse.

Outros iam para os sanatórios, situados principalmente em lugares altos, sendo a serra do Caramulo um ponto bem marcante.

As pessoas afectadas tinham louça própria e nada podiam compartilhar com os outros. Havia uma desinfecção cuidadosa de tudo o que usavam e quando faleciam, era tudo queimado.

Lembro-me também de se ir ao dispensário fazer o “pneuma”.

Por volta de 1942 o aparecimento da estreptomicina começa a resolver os problemas e então já a grande maioria se salvava.

Aqui fica esta meia dúzia de palavras que recorda uma época difícil da nossa infância em que a doença fez vítimas em muitas famílias do MEU BAIRRO.