sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Lembrando o Dr. Silva Pereira no 110º Aniversário do seu Nascimento

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 05.07.1991)



Deixámos nas páginas deste jornal (10 de Maio de 1991), uma pequena biografia deste poeta varzeense quase desconhecido dos seus conterrâneos.

De um poeta, tem-se sempre algo mais para dizer, já que são sempre personalidades ricas e controversas.

Mas hoje, não é nesse campo que vamos entrar. Pretendemos apenas recordá-lo no seu aniversário que passa amanhã, dando a público um poema intitulado, ECOS DISTANTES, no qual o poeta, além de mostrar o seu valor literário, revela mais uma vez o grande apego ao lugar onde nasceu.


[Casa onde nasceu e faleceu o Dr. Silva Pereira. Foto JV]

ECOS DISTANTES

Vós, meninas dos meus olhos,
Aprendestes a chorar, a chorar,
Com a fonte de água fria
Que mansamente corria
Junto à casa em que eu nasci!

A chorar,... a cantar,...a rezar...
Que singular e estranho hino,
Murmurado, noite e dia!

Mas aquelas eram frias,
E vós sois quentes, requentes,
Lágrimas minhas dolentes.

Ah! mas quem me dera ali,
Quem me dera ser menino,
Junto à casa em que eu nasci!

E os rouxinóis e carriças,
Junto à fonte, junto ao rio,
Pelas quintas pequeninas,
Cantavam, ao desafio,
Te-deuns solenes e missas,
E vésperas e matinas!...

Foram estes os missais,
Por que eu aprendi,
A rezar, a cantar, a chorar,
Quando eu era pequenino,
Junta à casa em que eu nasci.

Correrá inda a fonte,
Ou ter-se-á secado o monte?
Terá caído a casa em que eu nasci?
Existirá o quadro em que eu sonhava d’antes?

Como tudo fica longe!
-Tristes ecos, já distantes,
Duma vida que eu vivi...

Ah! que saudades eu tenho
Da casa pequenina em que eu nasci!

Mas, não, não quero ver-te mais!
Que vendo-me nascer, sendo o meu berço,
Quiseste um dia ser o inverso:
- Foste e na minha ausência, a tumba de meus pais!


A fonte que abastecia a povoação, correndo mansamente, o seu murmúrio, noite e dia!, sempre o desejo (encoberto por vezes) de voltar à casa em que nasceu; os rouxinóis e as carriças que por ali ainda saltitam, com o seu cantar ao desafio; as quintas (tão características da freguesia) e o sentido religioso, sempre uma constante.

O terror que o invade ao admitir a fonte seca, a casa arruinada.

Sempre a saudade, a distância a que se encontra...

Nos quatro últimos versos, é o choque de posições, tão próprio dos poetas!

Aqui fica este poema, inédito segundo pensamos e escrito há mais de cinquenta anos! Mais uma vez a memória do poeta que nos perdoe o atrevimento.

Pensamos que possuindo a freguesia um grupo cénico, não seria descabido que nos seus espectáculos fossem ditos alguns poemas deste conterrâneo, principalmente aqueles em que lugares da freguesia se possam rever. Para mais, temos o grupo orientado no aspecto artístico por um senhor que muito bem dizia e que certamente continua a dizer, poesia, o que facilitava a possível escolha e preparação de um elemento que muito pode aprender com Nuno Neto de Almeida.

É uma sugestão que aqui deixamos.


[Actual estado da casa onde nasceu o Dr. Silva Pereira. Foto JV, 2009]


Pequena nota

Os textos aqui publicados são a cópia fiel dos que foram publicados no Correio do Ribatejo. Muitas vezes as ilustrações não são as mesmas pelos motivos mais variados, como neste acontece.
Ficam assim os nossos leitores alertados para o facto.

JV