quinta-feira, 23 de abril de 2009

A Capela de Sto. António, "Ex-Libris" de Vilgateira

(Publicado no Correio do Ribatejo de 22 de Fevereiro de 1991)


Situada no centro da aldeia, talvez tenha sido o seu pólo de desenvolvimento.

Data pelo menos do século XVII, conforme atesta o lintel da porta principalal onde está gravado o ano de 1623.

A sua existência tem sido difícil e já por várias vezes estado em ruína, chegando mesmo a ser proposta a sua utilização para outros fins.


[A Capela se Sto. António. Desenho de J.V.]

Pinho Leal dá-nos conta de um restauro efectuado em 1880, pelo povo e de iniciativa do benemérito Padre António de Carvalho. (1)

Em 4 de Janeiro daquele ano, o Presidente da Junta de Paróquia propõe que se levasse o “Sto. António” para a Igreja Matriz, onde estaria com a decência devida. O regedor Joaquim Ferreira disse que se responsabilizava pelo arranjo da capela. (2)

As obras iniciaram-se nos fins de Abril e no dia 25 levou-se processionalmente a imagem do padroeiro para a igreja matriz, onde se conservou até ao dia 14 de Agosto, data em que a capela foi reaberta ao culto.

Diz-se que ficou lindíssima e um pouco mais ampla. (1)

Às seis da tarde o prior da freguesia de Nª Sª da Várzea, Reverendo Padre António de Carvalho, benzeu-a solenemente conforme o ritual romano e na presença da Junta de Paróquia e da Irmandade do Santíssimo Sacramento.

Regressado o padroeiro ao seu altar, também em procissão, subiu ao púlpito o Reverendo Manuel de Carvalho que em breve e comovente prática avivou a devoção dos fiéis para com o padroeiro e agradeceu a eficaz cooperação de todos para a rápida conclusão das obras. (1)

Os festejos continuaram por mais dois dias com missas cantadas e sermões, música de igreja e de arraial pela Banda de Rio Maior e na tarde dos dois últimos dias as célebres cavalhadas. (1)

Pinho Leal ao afirmar que a iniciativa pertenceu ao Padre António de Carvalho, parece não corresponder à verdade, já que a Junta de Paróquia deliberou, em reunião (3), agradecer ao Sr. Joaquim Ferreira (Regedor) e à benemérita Comissão que o acompanhou nos esforços que empregaram para concluir a obra da “reedificação da Capella de Sto. António”.

Pelo terramoto de 1909 que assolou o Ribatejo, principalmente a zona de Benavente – Salvaterra de Magos, também ficou danificada, paredes fendidas e a ameaçar ruína.

Cinco anos depois encontrava-se novamente em mau estado e o Presidente da Junta propõe a retirada da imagem do padroeiro, pois a capela está a ruir. Adverte de que se os fiéis não a repararem, a Junta adapta-a a escola ou casa para fins diversos mas de utilidade para a paróquia.

Parece assim, deduzir-se, que “fins religiosos” não eram úteis na interpretação da Junta (Republicana).

Mas não foi desta que a capela desapareceu, pois mais uma vez surgem vilgateirenses a constituirem-se em Comissão e a evitar o seu desaparecimento. Coube essa honra a Joaquim António Montez (vulgo Joaquim da Mariana), também regedor, Joaquim Vargas e João Lourenço.


[Joaquim António Montez, vulgo Joaquim da Mariana, frente à sua casa, hoje sede dos Galitos da Várzea]

A capelinha foi alpendrada (1) mas, sofrendo novamente grande reparação em 1939, pois encontrava-se em ruína, havendo mesmo quem alvitrasse a hipótese de palheiro, substituíram o alpendre por escadaria semicircular de cimento, onde se encontra lavrada aquela data.

A fachada de bico é encimada por cruz de alvenaria e possui pequeno óculo oval que areja e ilumina o templo. Tem sineta. Porta rectangular de ombreiras e lintel de pedra lisa. Cada uma das paredes laterais possui janela gradeada.

Ao entrar, deparam-se-nos dois colunelos de pedra já carcomidos pelo tempo, sendo cada um constituído por duas peças e que suportam um pequeno coro. Debaixo deste, uma área ladrilhada.

Planta rectangular. O tecto é de madeira e de três panos. Altar de pintura marmórea. Em lugar de destaque o padroeiro com o Menino. Ladeiam-no duas pequenas imagens:- Stº Isidro e Nª Sª de Lurdes. Existiu outra que desapareceu não há muitos anos. Trata-se de uma imagem de pedra, muito antiga e representando Sant `Ana. Onde estará? (5)

A sacristia toda ladrilhada tem acesso exterior por escada adossada em cujos degraus estão integrados vários fragmentos de lápides sepulcrais dos séculos XVII e XVIII de impossível reconstituição. (6)

Estas pedras são oriundas do antigo cemitério paroquial, próximo da igreja matriz. (7)

De notar um curioso ex-voto sobre tábua (cerca de 20X45 cm) de fins do século XVIII, figurando Sto. António a aparecer a uma devota. (7)

No tosco armário uma imagem de Cristo, dois cálices e um missal de 1860. Parece-nos de interesse um grupo de azulejos soltos que talvez sejam peças do século XVII.

Tal como as restantes então existentes na freguesia a capelinha sofreu o jacobinismo dos soldados de Massena. (8)

Teve romaria muito movimentada.

Passando por variadíssimas vicissitudes, apesar disso o povo dedica-lhe estima e nas aflições “agarram-se” a Sto. António.

O altar era, e pensamos que ainda é, iluminado com azeite oferecido pelos vilgateirenses que o fazem com devoção.

Não é descabido dedicar uma palavra à memória da Sra. Maria Amália, grande devota de Sto. António que durante muitos e muitos anos foi claviculária da Capelinha, prestando-lhe toda a assistência possível:- ornamento, limpeza e promovendo peditórios para resolver algumas necessidades.

Muito recentemente por estar em obras a igreja matriz fez as suas vezes.

Inscrita na matriz predial sob o nº 189, pertence à Fábrica da Igreja Paroquial e tem uma área de 65 m2.

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NOTAS

(1)-Portugal Antigo e Moderno, 1873-1890.
(2)–Livro de Actas da Junta de Paróquia iniciado em 1873, acta de 4 de Janeiro de 1880.
(3)–Idem, acta de 14 de Agosto de Agosto de 1880.
(4)–Livro de Registo de Actas da Junta de Paróquia, nº 2, termo de abertura de 16 de Janeiro de 1908, acta da sessão de 26 de Abril de 1914.
(5)–A identificação das imagens foi feita pela Sra. Maria Amália.
(6)–Tesouros Artísticos de Portugal, Selecçõae do Reader´s Digest, 1976.
(7)-Informação prestada por António Eloi Godinho que na altura presidia à Junta de Freguesia.
(8)–Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira