sexta-feira, 30 de abril de 2010

Pedro Nunes da Costa

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 5 DE JANEIRO DE 1996)

Natural de Tomar.

Notabilizou-se no campo religioso e estudou jurisprudência na Universidade de Salamanca. Preterido no lugar de inquisidor de Santo Ofício em Lisboa, entra na Casa da Suplicação (1565) onde foi desembargador dos agravos, juiz dos feitos da coroa e por último, desembargador do Paço.

[Salamanca]

Seguiu o partido de D. António, Prior do Crato, o que lhe causou alguns problemas.
Deixou algumas obras manuscritas.
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Grande Enciclopédia portuguesa e Brasileira

segunda-feira, 26 de abril de 2010

A barbearia

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 26 DE ABRIL DE 2002)


O tema que nos tínhamos proposto abordar, não era este mas no desenrolar da escrita a que o pensamento deu forma, aparece-nos este estabelecimento onde passámos muitas e muitas horas, principalmente na época de férias; eu e os meus amigos.

Estamo-nos a reportar, como é hábito, nestas simples e despretensiosas croniquetas aos anos cinquenta do século passado.

Se existem coisas comuns aos dias de hoje, as diferenças não são poucas. Ainda que a função seja a mesma, as técnicas evoluíram, o ferramental modificou-se, com tendência para a mecanização, os produtos utilizados são completamente diferentes, os cabeleireiros apresentam-se equipados de uma maneira diferente e até os nomes das coisas se alteraram, são mais pomposos e procura-se uma actividade para ambos os sexos em situações e posições consideradas mais evoluídas.


O barbeiro do MEU BAIRRO trabalhava no sábado até altas horas para pôr em ordem barbas e cabelos visto que muita gente só tinha vagar para o fazer nesse dia e por outro lado era para muitos dia de receber a féria. Além de cabelos, havia fregueses certos para a barba que era cortada só aos sábados.

Não se pense que não se trabalha ao sábado, ou que só o barbeiro o fazia. Nessa altura, só o domingo era considerado dia de descanso. Por vezes conseguia-se uma pequena dispensa do patrão que acabava por ser compensada na semana seguinte.

[Junto à barbearia para irmos jogar uma partida de futebol. Que eu saiba, metade já faleceram. Foto de 1958]

Havia alguns bigodes, que muitos dos velhos republicanos não dispensavam, e um ou outro rapaz novo usava o seu, copiado de algum conhecido artista de cinema .Pêras e barba, era raríssimo aparecer.

O mestre barbeiro, quando conhecia menos o freguês, perguntava para desinfectar a cara se desejava álcool ou sublimado.

Alguns dos jovens desse tempo usavam o cabelo “à pipi”, o que significava ser puxado todo para trás, tendo à frente uma grande popa, toda uma estrutura que o “fixador ”armava. Quando acabava o corte do cabelo voltava a aparecer a pergunta sacramental.- brilhantina ou fixador ?

Havia também quem por motivos de vária ordem, nomeadamente económicos e sanitários, o cortasse “à escovinha” ou “à máquina zero”.

A pequena barbearia situava-se no rua principal do MEU BAIRRO, a chamada Avenida e numa posição central, o que também acontecia, de uma maneira geral, com o comércio tradicional e próprio da época. Tinha a competente cadeira giratória para adultos e um banco de madeira, alto, para as crianças. Algumas vezes nele me sentei e quando passei para a cadeira, senti-me um homem!

Um espelho rectangular e ao alto, duas pequenas meses, uma de cada lado do espelho onde o artista colocava o seu ferramental constituído por pentes de alumínio, tesouras de pontas arredondadas, máquinas (manuais) em que se substituíam as peças conforme o trabalho a realizar, várias navalhas com o seu assentador que estava frequentemente a ser utilizado, para dar fio, quando elas trabalhavam, pincéis de forma cilíndrica que se humedeciam em pequenos recipientes, tipo tigelas e invariavelmente de alumínio, depois de previamente abastecidos de um pó branco (pó de sabão) retirado de caixas de papelão em forma de paralelepípedo.

Um pincel avantajado destinava-se a retirar os cabelos já cortados e um pequeno espelho era dado ao cliente para poder verificar se estava do seu agrado o corte feito na parte directamente não visível. Uma escova para o retoque final no freguês era peça indispensável.

Na pequena divisão contígua, encontravam-se as toalhas para a barba e as alvas toalhas destinadas ao corte de cabelos.

As pequenas mesas, de tampos rectangulares e penso, sem ter a certeza, protegidos por um vidro grosso, além de receberem os objectos no tampo, tinham outro para o mesmo fim e por cima da gaveta que o barbeiro utilizava para guardar o dinheiro. Em secção distinta, existiam os recipientes de formas abauladas, feitos de qualquer liga parecida com o “inox”, para álcool e sublimado, a caixa de pó de arroz, da mesma substância, além dos frascos de brilhantina, fixador e até de perfume. A petizada ia sempre cheia de pó de arroz!

Junto da parede oposta à do espelho, encontrava-se uma pequena mesa igualmente rectangular, com trabalhos circundantes de embelezamento sob o tampo e cujos quatro pés de secção quadrangular e longilíneos, eram mantidos em boa posição por uma ligação de madeira entre eles.

Nesta mesa era certa a presença semanal do Correio do Ribatejo que os fregueses aproveitavam para ler enquanto esperavam pela sua vez. Quem não tinha ido assistir aos jogos locais, aproveitava para ler as grandes reportagens em que entravam “Os Leões” ou o “União Operária”. Nas horas mortas de trabalho, a mesa era aproveitada para algum jogo de bisca lambida ou uma partida de poker

Penso não errar ao afirmar que existia um aparelho de rádio portátil.

Além da mesa, por cima da qual existia um suporte feito de ripas para chapéus e bonés e na outra parede um cabide, existiam pequenos bancos de tampo circular, (ou seria quadrangular?) de pés resistentes e confeccionados a partir de duas tábuas que ao meio se cruzavam.

[O autor destas linhas, o barbeiro Ramiro Valamatos (já falecido), Mário Bento e o miudo que morava no pátio ao lado e a quem chamavamos "Marcelino", por brincadeira. Foto de 1958]

Todo o mobiliário era de madeira e pintado de verde mas não sei bem porquê, penso que teria sido o azul a primeira cor utilizada. Nunca me lembro de haver qualquer outra mobília e penso que foi o meu bom amigo, Senhor José de Oliveira que fundou tal oficina e que foi obrigado a deixar devido a outras actividades profissionais pois tinha estabelecimento comercial misto constituído por taberna e mercearia. Quando exerceu a sua actividade de barbeiro, vestia uma bata branca.
Além deste Senhor, que muitas vezes me cortou o cabelo em criança, não posso deixar de lembrar o meu saudoso amigo, Ramiro Valamatos, que já trajava de uma maneira diferente, usando um casaco branco, infelizmente já falecido, vítima da doença que sempre o atormentou. Há muitos anos que era proprietário de um estabelecimento do mesmo ramo na cidade de Torres Novas onde veio a fixar-se e faleceu.

Lembro-me de ter cortado o cabelo, na rua do Matadouro no senhor Horácio, ao lado ou perto da oficina de bicicletas, Pestana.

Como já disse, comecei a escrever procurando traduzir outras reminiscências e quando dei por mim, estava enfronhado nesta que acabei por concluir. É possível que existam falhas e imprecisões que o leitor do MEU BAIRRO e da minha época, corrigirá, se nos ler.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Manuel dos Santos Cruz

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 29 DE DEZEMBRO DE 1995)

É irmão da Figura anteriormente referida, como ele médico e nascido em Santarém.

Viu a luz do dia a 16 de Outubro de 1792, por isso quase cinco anos mais novo do que o irmão.

Igualmente se formou em Coimbra mas obteve também o curso de Filosofia.
Seguindo as pegadas do seu irmão, exerce a medicina na sua terra natal até 1832, mas acaba por se deslocar para Lisboa, tornando-se a sua acção notável pela ocasião da cólera mórbus.

Foi eleito deputado às Cortes Constituintes de 1837.

Resolve emigrar e vive em Marselha (França) vários anos e depois em Canaveral (Espanha), no rio Tejo, entre Cáceres e Plasência.

[Catedral de Cáceres]

Acaba por regressar a Portugal (1850) e fixa residência novamente em Lisboa onde continua a exercer clínica até falecer, o que acontece em 19 de Junho de 1853.
Escreveu:- “A Europa sem véu”, “Ultimato aos gabinetes, etc., Lisboa, 1835”, “Teremos nós outra Constituição em Portugal, ou reintegrar-se-á a guerra civil ???, Lisboa, 1836”, “Manifesto à Europa sobre a Revolução de Lisboa, Lisboa, 1836”, “Manifesto de um cidadão aos Ministro da Coroa e à Nação sobre a Revolução de Lisboa, 1838”, e “Projecto de Constituição Política apresentado às Cortes em 1837, Lisboa, 1837”

De parceria com Matias Botelho de Mendonça redigiu a folha política Hércules Lusitano, que se publicou em Lisboa, em 1836.

Depois da sua morte foi publicada em 1858 uma colectânea das suas obras.
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terça-feira, 20 de abril de 2010

D. José da Câmara, 11º Conde da Ribeira Grande

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 3 DE JANEIRO DE 1992)


Título outorgado a D. José Maria Gonçalves Zarco da Câmara, por alvará do Conselho de Nobreza de 20 de Abril de 1947, em nome do Duque de Bragança, Senhor D. Duarte.

Filho do 10º Conde, que foi Par do Reino e bacharel em Direito, nasceu em Lisboa a 9 de Dezembro de 1898 (1) e faleceu na sua Quinta do Mocho, em 29 de Maio de 1961.

Mais um fidalgo que deixou a sua vida ligada a esta freguesia, na qual residiu e onde possuía avultados bens.

Assistia com frequência à missa dominical na igreja matriz da freguesia. Interessava-se pelos seus problemas e apoiou a fundação dos “Galitos da Várzea”,

Vimos o Senhor D. José do Mocho, como era vulgarmente conhecido, uma únuca vez, teríamos uns onze anos e acompanhávamos o nosso pai.

Apesar da pouca idade, já tínhamos ouvido falar bastantes vezes nele, ao povo e sempre de uma maneira que nos impressionava, já que era unânime as boas referências que lhe ouvíamos fazer.

O cumprimento a que se seguiu uma breve troca de impressões, teve para mim algo de diferente.

Logo que nos foi possível, bombardeámos o nosso progenitor com as mais variadas perguntas para as quais íamos obtendo as respostas possíveis.

[Quinta do Mocho, que lhe pertenceu. Foto JV, 1991]
Era-nos esclarecido ser uma pessoa altamente respeitada pela linhagem, porte, fino trato e bondade, gozando de grande estima entre a população.

Um velho amigo que entretanto tinha aparecido, exímio executante na Banda dos Bombeiros de Santarém, chamou-nos a atenção para o facto de ser grande conhecedor de música erudita e mesmo executante.

[Fonte na EN 114, próximo da Quinta do Mocho e hoje recuperada. Foto JV, 1991]
Pensávamos nós, nos nossos onze anitos, que um fidalgo havia de ser diferente dos outros homens!

Mas para falar do Senhor D. José, nada como recorrer à grande figura escalabitana que foi o saudoso Dr. Virgílio Arruda e respigar alguns dados que sobre ele escreveu na passagem do 25º aniversário do seu falecimento.

“Pertencendo a uma das mais distintas famílias, não se distinguiu apenas pela nobilitante gerarquia dos seus  ascendentes.

Mais do que fidalgo pelo sangue, a sua fidalguia vinha-lhe do coração e do espírito, da nobreza dos seus sentimentos, do ascendente da sua intelectualidade, da sua cultura artística, da sua veia lírica, da sua execução musical e da lhaneza so seu trato pessoal.

Muito lhe ficou devendo Santarém pela sua participação activa em tantas actuações culturais, em obras de benemerência, em concertos musicais, em empreendimentos teatrais, em conferências e em outras iniciativas de interesse público”.

E continua o Senhor Dr. Virgílio Arruda: “Salientemos ainda o mérito que do seu convívio pessoal advinha a sua vontade de bem servir da sua modéstia exemplar, da sua esmerada educação, do seu incessante contributo para o bem dos outros.

Da sua cultura literária, do seu lirismo de poeta desconhecido do grande público, da sua classe de grande instrumentista – exímio no violoncelo – afeita à interpretação magistral de partituras transcendentes, D. José Ribeira assinou uma época da vida santarena que se pode considerar, sem favor, a nossa idade de oiro”.

A vinda a Santarém de orquestras de grande categoria, regidas por Debroen, Igor Maskevizs, Pierino Gammba e outros e de instumentistas, como Ginette Leveux, Michelin, Paul Breton e outras figuras de primeira grandeza, a participação dos maestros Silva Pereira, Luís Silveira, Belo Marques, Fernando Cabral, Joel Canhão e outros dedicados regentes do Coral Scalabitano, para isso contribuíram.

Tendo vivido durante muitos anos em Inglaterra, manteve relações com individualidades estrangeiras que frequentemente o visitavam na sua residência da Quinta do Mocho e na de Santarém”. (2)

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NOTAS
(1)–Nobreza de Portugal, 1961 e Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira.

(2)–“Uma efeméride – D. José Gonçalves Zarco da Câmara (Conde da Ribeira Grande), faleceu há vinte e cinco anos”, Virgílio Arruda, in Correio do Ribatejo, de 29 de Maio de 1986.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Francisco dos Santos Cruz

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 29 DE DEZEMBRO DE 1995)

Nasceu em Santarém a 10 de Outubro de 1787 e formou-se em medicina na Universidade de Coimbra em 1814.

Durante as Invasões Francesas, serviu no batalhão académico.

Exerceu clínica na sua terra natal mas em 1815 passou a residir em Punhete (actual Constância) mas vinte e um anos depois fixa-se em Lisboa onde é nomeado Presidente do Conselho de Saúde, em 1846.

Merecendo-lhe muita atenção a prostituição, organizou vários regulamentos nesse sentido.

Foi sócio efectivo da Academia das Ciências de Lisboa mas acabou por pedir a demissão por motivos particulares.



Morreu em Lisboa no dia 30 de Março de 1859 e deixou escrito: - “Descrição Económica de certa posição considerável do território da Comarca de Tomar”, “Descrição Topográfica Médica da Vila de Punhete”, “Da prostituição da cidade de Lisboa, etc.1841, “Ensaio sobre a topografia médica de Lisboa, etc. 1843”, “Memória sobre os diferentes meios de atalhar incêndios, etc. 1850”, “Elogio Histórico Necrológico do Dr. Francisco Tomás da Silveira Franco”, “Trabalhos Académicos, literários e científicos, Lisboa, 1851”, “Opinião sobre a sorte futura de Lisboa em o Verão de 1858, Lisboa 1857” e “Febre amarela no Porto, em 1856, etc.,, Lisboa, 1858”.

Como se acaba de ler, a sua acção abordou variadíssimos temas.
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quinta-feira, 15 de abril de 2010

O Carnaval

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 16 DE MARÇO DE 2001)

Acordei cedo e bem disposto, o que nem sempre acontece. Recostei-me na cama e deitei a mão a um dos livros que tenho sobre a mesa-de-cabeceira. Não são livros de começar na primeira página e ir até ao fim, o que acontece quando se lê um romance, são livros de conteúdos ligados mas que se podem ler separadamente, saltitando conforme o interesse específico e momentâneo do leitor. No caso tratava-se do XIV volume da História de Portugal do Senhor Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão, recentemente dado a público. Procurei-o em quatro cidades (é verdade, não estou a brincar) no centro e sul do país e não foi possível adquiri-lo e acabei por recorrer à nossa cidade onde o encontrei na primeira casa em que entrei.

Peguei no livro, fui ao índice escolher assunto, li dois ou três e acabei por pô-lo no mesmo lugar. Não estava virado para aí!

Apeteceu-me pôr o computador já com mais de seis décadas e que vai revelando algumas roturas, a funcionar, procurando algo no arquivo das recordações.

Apesar das falhas encontradas, alguma coisa se nos avivou e é isso que pretendemos transmitir para o papel, fazendo recordar estes e outros factos às gentes do MEU BAIRRO e da minha geração e dando-os a conhecer aos hipotéticos jovens que nos possam ler.

Pelo menos na minha vivência, a cidade de Santarém nunca teve grandes tradições carnavalescas e isso consequentemente se reflectia no MEU BAIRRO. Na minha meninice, ouvia falar no Carnaval de Alpiarça onde a farinha era rainha e segundo se dizia todos os veículos que por lá passassem eram “obrigados” a parar pagando os seus ocupantes uma taxa que se traduzia por serem enfarinhados. Nas redondezas, não me lembro de ouvir falar em qualquer outro.


Recordo haver restrições ao uso da cara tapada com a consequente intervenção policial e a algum tipo de brincadeiras, consideradas não adequadas.

O Carnaval no tempo da juventude de meus pais, na vigência da 1ª República e segundo contavam, era muito diferente com a utilização, além da farinha, do pó de sapato e de ovos podres, entre outras coisas o que fazia referir a meu pai ser uma pouca vergonha não se podendo sair à rua. Nos salões da cidade os “confettis” abrilhantavam os bailes com arremessos nos mais variados sentidos conforme as preferências das donzelas.

No MEU BAIRRO, os miúdos, que aderem sempre muito bem a estas coisas, alguns a custo conseguiam uns tostões para comprar uma caraça feita de pasta de cartão e exteriormente pintada com uma cor ainda hoje utilizada pelo palhaço rico. Quem não arranjava os tais tostões, resolvia o problema fazendo uma com o cartão de uma caixa de sapatos, desenhando-a à sua medida, fazendo os buracos para os olhos, boca e nariz, pintando-a a seu gosto e fixando-a através de um elástico que atava junto à nuca, tal como acontecia com aquelas que se compravam no comércio do Bairro e que já referimos. Também aqui se vendiam serpentinas avulso já que muito poucos tinham dinheiro para adquirir os pacotes, sacos de papelinhos e estalinhos, igualmente avulso. As garrafinhas de mau cheiro já existiam mas só se vendiam no comércio da “cidade” como nós dizíamos.

Já espigadote, uma querida tia comprou, a mim e aos filhos da mesma idade e no Senhor Zé Magrinho (depois dos Bigodes), permita-me o meu bom amigo a expressão mas só assim é possível a identificação comum, uma novidade da época e a que poucos chegavam: - uma bisnaga, penso que era assim a designação que lhe dávamos

Tratava-se no caso de um pequeno reservatório de secção circular, insuflado, transparente de um lado e colorido do outro (a minha era azul claro) e que possuía um pipo. Como era feito de uma substância com alguma maleabilidade, introduzido o pipo num líquido e pressionada, acabava por encher ficando assim pronta a ser utilizada com novas pressões que originavam a saída de um esguicho que iria molhar as nossas vítimas.

O líquido a utilizar era normalmente água mas havia quem usasse perfume e mesmo ... urina.

Uma das brincadeiras mais usadas por miúdos e graúdos constava da utilização de rabos, isto é, cortavam-se tiras de papel, vulgarmente de jornal que se ligavam por intermédio de um alfinete dobrado na ponta. Sorrateiramente e na melhor ocasião que podia ser sentado ou a andar, se espetava na calça ou saia, no traseiro pelo que a pessoa quando se levantava ou andava, mostrava o traseiro rabudo, motivo de sorrisos, comentários e mesmo gargalhadas, o que punha em alvoroço e por vezes em irritação o contemplado.

Os mascarados que percorriam as ruas do BAIRRO, normalmente em grupos, limitavam-se a vestir andrajosamente (roupas velhas e avantajadas) e quando não tinham caraças, cobriam a cara de negro passando uma rolha de cortiça queimada por ela ou em alternativa “desenhando” grandes bigodes e barbas.

De uma maneira geral os mascarados trocavam de “sexo”, aliás, como ainda acontece.

O que hoje se faz com imitações bastante perfeitas de bicharada e outras, lembro-me que se fazia no MEU BAIRRO com os frutos de uma planta expontânea que unidos com alguma habilidade e sendo verdes, “fabricavam” lagartos que provocavam medo às moças mais impressionáveis pois fixavam-se com facilidade nas suas roupas.

Não esqueço o João Vareiro que festejava o Carnaval saindo com o seu cantil de “louça das Caldas” colocado à cintura e passeando pelas ruas do BAIRRO não deixando de beber um copo com os amigos nas tabernas existentes.


Os trajes finos e a rigor eram muito poucos (damas antigas, ciganas, sevilhanas, etc.) e destinavam-se aos mais jovens, fazendo visitas a familiares e amigos aproveitando-se então para tiragem de uma fotografia que ficaria para a posteridade.

Pela parte que me toca, mascararam-me uma única vez com traje fino de que me lembro perfeitamente e era bem pequeno pensando rondar os quatro anitos. Por vezes mete-me confusão como me lembro tão bem do facto !

Foi um casal de vizinhos, com idade de serem meus avós, que o fizeram, duas pessoas que nunca esquecerei pelo carinho que me dedicavam apesar de terem filhos, um rapaz, o mais velho e uma rapariga, gente já casadoura. Lembro-me bem do nome dos quatro e mesmo das suas figuras. Moravam na minha frente num prédio que já não existe.

Faziam-me todas as vontades e eu corria para eles como se fossem da minha família. Ela então, que era amiga de minha mãe, estava sempre a defender-me de qualquer traquinice que fizesse, já que minha mãe não era para brincadeiras. Pois num ano resolveram mascarar-me de moço de forcado, a rigor. Não sei se alugaram ou fizeram o traje, o que eu sei é que me sentia muito inchado por estar vestido assim, de cinta apertada, jaqueta justa, barrete na cabeça e caminhando todo emproado de forcado na mão. Fiz com eles um grande passeio, para os lados da Escola Agrícola e no regresso tiveram que me trazer ao colo.

Estimado leitor, sobre o Carnaval do MEU BAIRRO e há mais de cinquenta anos, foi o que o meu computador me trouxe à MEMÓRIA. Certamente se lembrará de outras coisas, porque não as revela?

domingo, 11 de abril de 2010

As Invasões Francesas

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 27 DE DEZEMBRO DE 1991)


Paralisado junto das Linhas de Torres Vedras, Massena resolve a 14 de Novembro de 1810, retirar-se para Santarém. Fá-lo protegido por um espesso nevoeiro.

A falta de recursos para fazer viver as suas tropas, já era grande (1).

Devido a isso, os actos de indisciplina amiudavam-se no meio do invasor. Apesar de assaltarem os lugares circunvizinhos e roubarem tudo o que podiam, a miséria agravava-se entre a hoste imperial.

Destacamentos procuravam víveres para serem distribuídos pela tropa. Deste modo, não tinham contam as incursões da soldadesca inimiga que levava a destruição e a morte onde quer que aparecessem.

Estas repetidas infâmias foram indignando cada vez mais os povos que andavam foragidos por onde podiam e não tardaram as vinganças. Sabe-se que da região do Bairro refugiou-se bastante gente para os lados de Almeirim e de Alpiarça. (2)

Desesperados, os paisanos nutrindo pelos invasores o mais justificado ódio, não lhe perdoavam sempre que os podiam apanhar.

Desciam de noite às povoações abandonadas e assassinavam quantos franceses surpreendiam a dormir e de dia davam-lhes caça nas encruzilhadas formando milícias.

A população apesar dos sofrimentos e das humilhações, colaborava na tarefa de tornar impossível a vida dos franceses. Quando abandonavam as suas casas, procuravam destruir tudo o que os franceses necessitavam, quando o não podiam esconder.

Milhares de oliveiras, laranjeiras e outras árvores foram cortadas pelos franceses para queimar ou fazer fortificações.

***
Em Alcanede encontrava-se o General Chausel que tinha substituído Junot, baleado numa missão de reconhecimento para verificar se os aliados se reuniam em Alcoentre.

Desde 24 de Outubro que um destacamento das tropas de Massena se aquartelara em Azóia de Cima, onde se conservou mais de quatro meses. Diz o povo local que para essa demora contribuiu a água da fonte da povoação, considerada das melhores das redondezas. (3)

A freguesia da Várzea encontrava-se assim debaixo da acção destes três focos, em que se incluía Santarém. Nestas circunstâncias foi cenário, tal como as freguesias vizinhas, de tão grandes barbaridades.

Existem referências escritas a factos passados nas freguesias da Romeira, Tremes, Arneiro das Milhariças e Abitureiras, entre outras.

Quanto à freguesia da Várzea, que é naturalmente aquela que mais nos interessa, também alguma coisa acabou por ficar escrito. Assim, na primitiva igreja matriz, os arquivos desapareceram e as dez capelas existentes na altura foram profanadas, saqueadas e devastadas, o mesmo acontecendo à dita igreja. Foi assim que começou o desaparecimento da Igreja de Santa Maria da Várzea, medieval e da capela e da capela de S. Miguel, de antiquíssima fundação (4). Das restantes nove capelas, algumas ainda assim continuam e outras até já desapareceram.

Nas zonas afectadas com mais intensidade, o povo mantém na memória alguns factos então ocorridos e que são transmitidos de geração em geração com as deturpações naturais até que diluem.



Foi-nos contado que numa residência da aldeia de Vilgateira, que ainda ostenta no piso superior, duas janelas de arcos ogivais e que pertenceu ao fidalgo, D. António Galache e é actualmente dos herdeiros de António Eloi Godinho, ainda há poucos anos existia, segundo o seu proprietário, um compartimento difícil de localizar que, segundo a tradição, teria sido utilizando com êxito, como esconderijo de alimentos e valores.

Também uma família da freguesia, segundo um dos seus membros, apanhou o apelido de um oficial francês que desertou e que por cá terá ficado, constituindo família.

Na realidade houve inúmeras deserções como afirmam os historiadores da Guerra Peninsular.

O antropónimo referido parece revelar importação.

Reconhecendo a possibilidade de se manter, Massena abandona pela calada da noite de 5 de Março de 1811, Santarém, deixando por falta de gado de tracção, umas doze ou catorze peças de artilharia e trezentas viaturas diversas, naturalmente tudo previamente inutilizado. (5)

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NOTAS

(1)–D. João VI, Mário Domingos, Edição Romano Torres, Lisboa, 1973.
(2)–Boletim da Junta de Província do Ribatejo, 1937/40, Lisboa, 1940
(3)–“Azóia de Cima através dos tempos”, Albertino Henriques Barata, Correio do Ribatejo de 2 de Abril de 1976.
(4)–Verbo, Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Vol 18, pág. 739.
(5)–“Santarém, seu valor militar na zona do Ribatejo, General Luís Augusto Ferreira Martins, Boletim da Junta de Província do Ribatejo, 1937/40.

terça-feira, 6 de abril de 2010

P. António Cerveira

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 15 DE DEZEMBRO DE 1995)

Nasceu em Santarém em 1678 tendo falecido na mesma cidade em 26 de Abril de 1730.
Formou-se em Teologia pela Universidade de Coimbra.

Esteve em Roma onde se notabilizou como orador sagrado, rivalizando com o P. António Vieira que também se encontrava por aquelas paragens.

Regressando a Portugal, pregou muitas vezes na Capela Real.

Deixou alguns manuscritos entre os quais uma relação da viagem que fez a Roma.
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sábado, 3 de abril de 2010

Celestino Graça

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 21 DEZEMBRO DE 1995)

Nesta série de escritos que estamos vindo a publicar sob o título de FIGURAS RIBATEJANAS, já referimos algumas nossas contemporâneas e entre estas, uma ou outra que conhecemos pessoalmente. Está neste caso, a que iremos hoje referir.
Não havia escalabitano nenhum que vivesse na sua terra que não conhecesse Celestino Graça. Podia não se conhecer o Presidente da Câmara ou o Governador Civil, mas Celestino Graça todos conheciam, dos adolescentes à terceira idade.
É evidente que nós também o conhecemos visualmente.
Quando iniciámos a nossa vida profissional, fomos para a Beira-Alta e já lá vão (como o tempo corre), trinta e cinco anos!
Na então vila realizavam-se (e realizam-se) festas anuais organizadas a favor dos Bombeiros Voluntários a fim de adquirir mais uns tostões para ajudar esta benemérita instituição.
A minha juventude e algum dinamismo fizeram com que colaborássemos na organização das mesmas no ano de 1963.
Os grupos folclóricos que Celestino Graça tinha fundado há cerca de seis anos, já tinham alto cartel e eram conhecidos de todo o país, através da televisão.
Como escalabitano e orgulhoso das coisas da minha terra, sugeri à comissão a presença dos agrupamentos, comprometendo-me efectuar os contactos, o que foi aceite e apoiado.
Escrevi a Celestino Graça e a resposta foi “à Celestino Graça”, além da “estória” que contei, era o pedido de um conterrâneo.
Com os meus vinte e dois anos fiquei radiante com o meu êxito!
Junto de dois elementos da direcção, infelizmente já desaparecidos, fomos receber a comitiva escalabitana à entrada do concelho o que Celestino Graça muito agradeceu.
Acompanhei a comitiva por tudo o que foi sítio. No tablado da FESTA DA MATA a exibição dos dois agrupamentos e os expressivos comentários de Celestino Graça constituíram um grande êxito.
Foi assim o meu contacto com Celestino Graça.

***





Celestino Pedro Louro da Silva Graça, de seu nome completo, nasceu em Santarém em 1914. Talvez no Grainho já que gostava de se intitular “barrão do Grainho”.

Frequenta a Escola de Regentes Agrícolas de Santarém (1925/1932) onde conclui o curso. O seu diploma foi o 192º concedido por aquela escola.

Em 1931, com colegas de curso e alunos do liceu, ajuda a fundar a Associação Académica de Santarém, onde foi atleta e dirigente.

Nos princípios dos anos cinquenta proferia palestras sobre agricultura na rádio local, o Rádio Ribatejo.
A 1ª Feira do Ribatejo realiza-se de 23 a 30 de Maio de 1954 e Celestino Graça já é o seu dinamizador e incansável obreiro, desempenhando as funções de Secretário-geral, ininterruptamente até 1974, ano em que se retira.

A Feira do Ribatejo devido à projecção que foi tomando, passou a ser também Feira Nacional da Agricultura, desde 1964.

De um dinamismo surpreendente, Celestino Graça desdobra-se pelos mais variados sectores para que tudo decorresse o melhor possível.

De voz bem timbrada e firme, a palavra ajustada saía-lhe com facilidade. Agarrado ao microfone, comentava como só ele sabia, as danças e cantares, os trajes, não esquecendo pequenos pormenores mas por vezes bastante significativos, doa agrupamentos folclóricos que iam passando pelo tablado, principalmente os da região ribatejana. Pelo que me toca, devo o pouco que conheço sobre o assunto a Celestino Graça, já que assisti, sem interrupção às catorze primeiras feiras.

Havia nessas alturas uma pequena “praça” de toiros improvisada, feita com varolas. Ali todos os jovens podiam mostrar as suas habilidades com as bezerras que eram lançadas no redondel. Celestino Graça, lá estava orientando o espectáculo, pondo a ordem necessária, ensinando, poupando uns e outros, fazendo os seus comentários e … rindo com as peripécias.

De tudo aparecia mas sem dúvida que os forcadas eram os mais frequentes, não fosse Santarém uma terra de afamados forcados!

Tinha de haver uma inscrição que passava naturalmente pela mão do grande santareno. Lembro-me que um dos candidatos a forcado era tão pequeno que Celestino Graça reprovou-o, mandando-o acabar de criar.

O rapazito vai de chorar copiosamente e Graça tenta explicar-lhe que ele é ainda muito pequeno para mostrar as suas habilidades, mas o rapaz não se deixa de lamentar dizendo que os outros podem, ele não!

Celestino Graça mandando escolher a bezerra mais pequena de que dispunha e com a ajuda de um categorizado forcado que estava presente, deu alegria ao rapaz que logo limpou as lágrimas na manga da camisa, bateu as palmas, não fugiu e lá agarrou o bicho com a ajuda.

Celestino Graça aproveitou a oportunidade para fazer as considerações que lhe pareceram justas, enaltecendo a raça do forcado que o rapaz possuía.

Era frequente a sua intervenção para libertar as bezerras após a pega já que os “valentões” apareciam depois!

Celestino Graça era grande “aficionada” sendo habitual espectador das melhores corridas realizadas no país e deslocando-se muitas vezes ao país vizinho.

No início da década de sessenta integra a Comissão Pró-Touradas.. Como a velhinha praça de toiros estava em péssimas condições , fez parte e foi a alma da Comissão Pró-Construção da Praça de Toiros que leva a cabo a construção da monumental praça de toiros de Santarém, edificada em tempo recorde e inaugurada no dia 7 de Junho de 1964. Ficou sendo a primeira do País, disponde de cerca de catorze mil lugares sentados. A partir de 1977, passou a chamar-se justamente, Monumental Celestino Graça, homenagem prestada pela Santa casa da Misericórdia de Santarém, proprietária do imóvel.

A partir de 1970 englobou a Comissão Organizadora das Corridas de Toiros, junto da Santa Casa.

Dos mais considerados etnólogos do país, fundou e dirigiu os agrupamentos folclóricos “Pescadores do Tejo” (1955), Rancho Folclórico do Bairro de Santarém (Grainho e Fontainhas), 1956, Rancho Infantil de Danças Regionais (1956) e o Grupo Académico de Danças Ribatejanas (1957).

Com os ranchos que fundou e dirigiu, principalmente o “Infantil” e o “Académico”, percorreu todo o país e visitou, entre outros países, Cabo Verde e Angola (duas vezes), então “províncias ultramarinas portuguesas”, Brasil, França, Espanha, Bélgica, Holanda Grã-Bretanha, Suiça e Itália, levando assim bem longe o nome de Santarém e do Ribatejo.

Em muitas destas deslocações estavam englobados festivais internacionais de folclore. Nestas andanças, Celestino Graça era convidado a proferir conferências sobre folclore, algumas para plateias bem exigentes, como aconteceu na Universidade de Cardiff.

Os responsáveis de ranchos e festivais tinham em Celestino Graça um admirador ou um critico consciencioso; louvavam-no ou temiam-no, como refere João Moreira, seu amigo, colaborador e admirador, que bem o conhecia.

Celestino Graça colaborou na imprensa assinando artigos sobre vários temas.
Faleceu no dia 24 de Outubro de 1975. Um seu busto encontra-se junto à praça de toiros que tem o seu nome.

Celestino Graça – um dos santarenos que mais deu à sua terra no último século.
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Santarém no Tempo, Virgílio Arruda, 1971
""Celestino Graça – orador – o seu último discurso, João Moreira, in Correio do Ribatejo de 25 de Outubro de 1985.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Lembrando os varzeenses que se bateram na Guerra Mundial 1914-18

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 20 DE DEZEMBRO DE 1991)


A escolha dos assuntos a abordar, como já verificaram, têm origens diversificadas.

Um dos filões que exploramos, é o facto histórico a nível nacional, pretendendo saber algo que se tenha passado a nível de freguesia.

É nesse sentido que elaborámos o tema de hoje.

***



A nossa participação na 1º Grande Guerra Mundial, que se verificou em 1917, não foi pacífica pois havia quem a defendesse e quem preferisse que ficássemos numa posição neutral.

Venceram os primeiros e daí a organização do Corpo Expedicionário Português, efectuado em poucos meses em Tancos e que comportou milhares e milhares de portugueses.

Naturalmente que o recrutamento também se fez sentir nesta freguesia.

É muito pouco o que vamos referir, tudo obtido por via oral mas que talvez por isso mesmo tenha interesse especial pois se não ficar escrito, vai diluir-se no decorrer dos tempos e perder-se.

Garantia-nos em 1980 um ancião vilgateirense amigo (1) e já falecido, que sabia e tinha conhecido todos os varzeenses que estiveram na Guerra, podendo mesmo referenciá-los um por um, sem falhar.

Não está em causa se falhou ou não na sua enumeração e se efectivamente sabia de todos os que tinham sido mobilizados. A verdade é que os indicados teriam mesmo lá estado, sendo dois ou três do nosso conhecimento, adquirido em conversações com a nossa mãe, na altura do conflito, ainda bem jovem.

Alguns dos nomes indicados são provenientes de alcunhas, visto o informador só os conhecer assim.

Fizemos algumas tentativas na década passada para os obter mas não foi possível. Aos eventuais familiares dos alcunhados aqui deixo o pedido de esclarecimento.

Todo este tema podia ser enriquecido por depoimentos de familiares já que é tradicional, assuntos destes passarem de pais para filhos – fica sempre na memória, um ou outro acontecimento que mais impressionou, ainda que haja condições para a deturpação.

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Estiveram em terras de Flandres, pelo menos treze varzeenses e indicamos em primeiro lugar, como simples homenagem, José Monteiro, que lá perdeu a vida,

Os Monteiro são uma família que ainda existe na freguesia.

Não temos a certeza, mas pensamos que já não vive nenhum dos restantes doze.

Manuel Lourenço, vulgo Ciclá (2), a quem nos referimos noutro tema e que conhecemos bem, por lá andou e contava de uma maneira peculiar o que tinha passado.

Era uma figura típica da aldeia de Vilgateira, castiço, com o seu barrete preto, calça de serrobeco e bota cardada. Vivia numa casita na rua que dá acesso à estrada para a Quinta da Narcisa, mourejando no bocadito de terra que aí possuía.

Recebia uma insignificante importância da Liga dos Combatentes, na altura chamada da Grande Guerra.

Procurava-nos anualmente para lhe fazermos um favor – pagar a “décima” da terra e das casitas – o que nada nos custava e fazíamos com gosto. Ainda estou a ver o seu agradecimento, tirrando de uma maneira muito própria o barrete, que sempre usou.

Outro combatente que conhecemos foi João Montês, vulgo João da Fonte, por morar no lugar da Fonte de Vilgateira, onde ainda tem descendentes.

Quando juntamente com outros cujo nome não posso precisar, regressou à sua aldeia, contava-nos a nossa mãe que tinha sido à noite, era domingo e havia baile.

Foi um alvoroço na aldeia, a notícia correu célere e todos queriam ver e abraçar aqueles seus conterrâneos que duvidavam pudessem regressar.

De Perofilho estiveramAntónio Nunes, António e José Faustino, cujos nomes de família ainda perduram na zona e Manuel Coxo. Este último, certamente por alcunha adquirida após o regresso ou proveniente de algum familiar. Ou seria que na altura “apuravam” mancebos com defeito físico?

António Paulino, vulgo Sardão. Ezequiel da Rosa e Manuel da Costa Baguim, que também conhecemos e foi para o Asilo dos Inválidos Militares, em Runa, são outros dos soldados indicados.

Dos Casais do Maio foi seu represente um António, por isso mesmo conhecido por António do Maio.

O único graduado, 2º sargento, era António Carreira, apelido de família ainda existente.

António Pito acabou por abandonar a região e fixar-se no Laranjeiro, concelho de Almada.

São, como vedes, muito simples as referências que aqui deixamos quando se acaba de comemorar o 73º Aniversário do Armistício.

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NOTAS
(1) – Foi Florindo da Costa Paulo, homem de rija têmpera, bom manejador de um pau ferrado.
(2) – Acabou por vender a fazenda e a casita, acolhendo-se a um Asilo ba Vila de Alcobaça, onde teria acabado os seus dias.